terça-feira, 12 de julho de 2011

O Novo Jornal e a Meia-Entrada

Nos últimos dias, a questão da meia-entrada e das carteiras de estudante estiveram em evidência na nossa cidade. Em duas edições, uma no domingo e a outra na terça-feira, o Novo Jornal evidenciou o que o movimento estudantil de Natal há muito tempo denunciava - há um mercado de carteiras de estudante no Rio Grande do Norte que alimenta o lucro e ganância de falsos líderes estudantis que há muito tempo não sentam num banco escolar.
Embora seja um direito antigo dos estudantes, foi em 2001, através de uma Medida Provisória (2208), que o ex-Ministro da Educação, Paulo Renato, pôs fim à exclusividade na emissão do documento de identificação estudantil. Naquela época, a UNE e a UBES sacudiam o país contra as privatizações, contra o provão e os sucessivos cortes de verba na educação brasileira. Com a MP, Paulo Renato buscou o fim das entidades. Ledo engano, nem a Ditadura Militar conseguiu nos derrotar.

Para efeito de comparação, seria como se o governo federal emitisse um decreto garantindo a qualquer grupo de advogado organizar uma entidade paralela à OAB, para emissão do documento de identificação do advogado, pelo fato da entidade estar em campanha contra medidas do governo direcionadas à sua categoria.

Em Natal, isso fez com que a União Metropolitana dos Estudantes Secundaristas (UMES) e a Associação Potiguar dos Estudantes Secundários (APES), entidades reconhecidas pela UBES (uma em nível municipal e a outra estadual), fechassem as portas porque eram incapazes de concorrer à nova lógica estabelecida pelo decreto. Entre virar empresas de carteiras, concorrendo com práticas de mercado, e fazer luta, organizando grêmios e manifestações, a entidade promoveu a escolha correta. Pagou o preço que a maioria das entidades brasileiras acabaram pagando: a APES há anos está sem diretoria consolidada e a UMES labuta para se reorganizar.

Isso teve um impacto que vai além da organização dos estudantes potiguares. Com o enfraquecimento do movimento estudantil, as mobilizações foram diminuindo, perdendo força e tamanho. Se a UMES, APES e UBES mobilizavam 5, 10 mil estudantes na década de 90, hoje manifestações com 3 mil pessoas são consideradas marcas para o movimento estudantil. Com mobilizações mais fracas, a força dos estudantes se tornou menor para ampliar e garantir novas conquistas.

Hoje, para aqueles que visitam as mídias sociais de determinadas "entidades" de carteiras estudantis, submetidas à lógica da MP 2.208, elas consideram "conquistas" levar o estudante que adquire a carteira a uma vaquejada ou eventos do gênero. Até mesmo o sorteio de uma moto vira conquista no discurso frágil dos empresários da carteira de estudante.

Desafio a qualquer uma das entidades submetidas à lógica do mercado (MP 2.208) a comprovarem, por meio de fotos, que promovem Congressos realizados com os estudantes. Desafio a provarem que seus estatutos estabelecem mecanismos democráticos de disputa para aqueles que desejam participar de suas diretorias. Desafio que comprovem, em suas histórias, mobilizações promovidas com estudantes na rua para conquistar direitos. Esses são desafios que nunca vão topar, porque estamos lidando com empresários de carteira de estudante e não com lideranças estudantis.

Por isso, nós não arriscamos em dizer que o maior inimigo do movimento estudantil brasileiro são os empresários de carteiras estudantis. Aqueles que lucram com um direito que eles nunca foram às ruas defender, lucram com um recurso que ao invés de ser revertido para organização dos grêmios estudantis, DCEs, para promoção de mobilizações políticas, de campanhas em prol da educação, revertem para favorecer seus "donos".

É por isso que o presidente da UBES, em entrevista ao Novo Jornal, afirmou "A UNE e a UBES não sobrevivem de meia-entrada, diferente dessa entidade (URNE), que é uma empresa de emissão de carteirinhas. Não vamos abrir mão de enfrentar essas empresas porque elas podem acabar com o patrimônio da meia-entrada" (sic).

Nós assumimos o bom combate. Ao enfrentar a mercantilização da carteira de estudante, nós vamos combater o falso estudante - aqueles que adquirem a carteira seja para comprar um ingresso mais barato no cinema, seja para utilizar o transporte público sem ser estudante. Vamos resgatar a organização dos estudantes em grêmios estudantis, contribuindo para qualificar a opinião e a força dos estudantes na luta pela melhoria da educação e recolocar a meia-entrada em seu verdadeiro lugar, como direito e não um negócio.

É por isso que a iniciativa da Prefeitura, NatalCard, UBES e UNE, é valorizada e hoje abrange o próprio segmento cultural de Natal. A iniciativa está moralizando um processo que há anos é tumultuado e desgastante para os próprios estudantes e pouco transparente para o exercício do direito à meia-entrada. Nossa guerra é pelo fortalecimento e ampliação das conquistas.

Encerro este artigo com a frase de Augusto Maranhão, para o Novo Jornal, que ilustra bem o momento pelo qual passam as empresas de carteiras estudantis, quando disse "eles (donos de "entidades estudantis de fachada") são empresários travestidos de estudantes. Eles têm que buscar outra atividade remunerada para ganhar dinheiro".

* Pedro Henrique é Vice-Presidente da União Metropolitana dos Estudantes Secundaristas (UMES).

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